Capítulo 1 – [A Receita de Assassinato]
Não havia um dia em que eu não ouvisse este nome.
— Tsukimori é tão adorável… — murmurou meu colega de classe Kamogawa, suspirando, para quem os outros estudantes do sexo masculino ao redor dele assentiram profundamente.
— Escutem rapazes, não deixem aquele corpo esbelto enganar vocês! Sacaram? Ela também tem... seios!
Seus audaciosos olhares estavam focados na garota em questão, Tsukimori, que estava cercada por um grupo de garotas tagarelas. Se eu tivesse que descrever Youko Tsukimori em uma palavra: ela era atraente.
— Você não concorda Nonomiya?
— Se você está dizendo.
— Uau, agora essa foi uma resposta fria! Você é realmente um homem? Se existe uma montanha, escale-a!1 Se há uma bela moça, apaixone-se por ela! Não é isso que significa ser um homem?
Os rapazes, liderados por Kamogawa, começaram a mostrar reações superexageradas à minha resposta indiferente.
— Bem, eu só acho que ela é perfeita.
Ela tinha um belo rosto, complementado por uma boa aparência e excelentes notas. Sua personalidade agradável a fazia bastante popular. Aparentemente, ela também era boa nos esportes. Youko Tsukimori parecia ser uma garota perfeita sem nada do que se pudesse reclamar.
— Isso é tão ruim assim?
1Citação a George Mallory, que, quando perguntaram numa entrevista por qual motivo ele queria escalar o Evereste respondeu: "Porque ele está lá".
— Eu nunca disse que isso era ruim. É só que eu não consigo relaxar perto dela.
— Ah, é verdade. Tsukimori é uma garota além do nosso alcance, afinal…
Felizmente, Kamogawa interpretou minha declaração como lhe conveio.
Minha honesta impressão era que ela era tão perfeita que seria entediante e sufocaria quem permanecesse ao seu redor. Talvez seja apenas por causa da minha personalidade um pouco desvirtuada, mas eu tenho secretamente mantido distância da Tsukimori por não conseguir descobrir nada em comum entre nós.
Entretanto, os rapazes pareciam estar altamente interessados na famosa garota e começaram a discutir rumores sobre Tsukimori como se estivessem fofocando sobre uma estrela.
— Mas eu ouvi que ela tem um namorado que está na faculdade, é verdade?
— Estudante “K”, não é? O cara que é três anos mais velho que ela?
— Eh? Eu ouvi que ela era a amante de um presidente de uma companhia...
— Ah, então é por isso que ela consegue ¥200,000 de mesada todos os meses?
— Não brinca! Mas eu ouvi que alguém a viu junto do professor de matemática Kumada quando estavam saindo de um motel!
Não havia mais necessidade de metáforas, ela realmente era uma estrela. Mais uma vez, percebi o quão especial ela era.
Mas, novamente, ela poderia não estar feliz com essa posição especial. Pelo menos eu não ficaria.
— Isso tudo são apenas rumores sem qualquer credibilidade.
Uma pequena risada escapou da minha boca porque eles estavam discutindo toda essa besteira tão sérios e energéticos.
— Por que vocês apenas não perguntam diretamente a ela? — Então, eu os havia confrontado com aquela questão. Só por diversão. E, como esperado, minha ideia foi rejeitada com um vigor próximo a vaias.
— Como se nós pudéssemos perguntar a ela algo desse tipo!
Como me diverti muito com a reação deles, eu os provoquei um pouco mais:
— Se vocês quiserem, eu posso ir perguntar como o representante da classe, o que acham?
— Espere, espere, espere! Nonomiya! Não apresse as coisas! O que nós iremos fazer se os rumores se mostrarem verdadeiros? — Kamogawa me repreendeu com pressa.
— Talvez eles sejam realmente só rumores, não é?
— Mas talvez tudo seja verdade!
Os outros rapazes assentiram em acordo com Kamogawa:
— É possível. Se é a Tsukimori, é muito possível!
Com certeza Youko Tsukimori se destacou nessa sala. Você poderia até mesmo dizer que ela era de uma natureza diferente. Não é de se estranhar que todos tenham a impressão que ela já tem experiência num mundo desconhecido para estudantes do ensino médio. Considerando sua atitude tão madura, era difícil acreditar que ela tinha nossa idade.
— A verdade está escondida nas trevas, hein?
Qualquer que fosse a verdade, eu poderia aceitá-la facilmente, já que não me machucaria como Kamogawa e os outros.
— A verdade nem sempre é o melhor, é?
Mas parecia que eles não podiam aceitar isso facilmente, uma vez que a verdade os incomodava muito mais.
— Vocês não acham isso improdutivo? Se vocês mantêm seus olhos desviados da verdade, não serão capazes de obterem o que procuram!
— Não nos importamos! Alguns dias atrás, algum idiota se confessou para ela e foi cruelmente rejeitado. Se você negligentemente tentar alcançar algo em um nível diferente, vai apenas cair e se machucar. Eu prefiro o ideal à verdade! Você poderia até mesmo dizer que nós queremos que a Tsukimori permaneça como fonte de nossas fantasias por toda a eternidade.
Eu estava tão impressionado com este grupo que só podia rir.
— A adolescência é maravilhosa, não é?
— Ei, nós temos dezessete! Deixe-nos com nossos sonhos!
Aparentemente, eu não deveria rir.
— Eu não incomodarei mais vocês, já que insistem.
— Insistimos, insistimos! Não esmague os sonhos de garotos delicados como nós.
— Você quis dizer “garotos impuros do ensino médio”.
— De quem nosso querido Nonomiya gosta, então? A propósito, celebridades não estão permitidas.
Kamogawa lançou um inesperado contra-ataque. Os outros rapazes também aproveitaram essa chance e diminuíram a distância, inclinando-se para frente e encorajando:
— Conte pra gente! Conte pra gente!
— Bem, deixe-me ver...
Pra falar a verdade, não havia nenhuma garota que eu poderia mencionar especificamente, mas, observando a situação, eu não acreditava que aqueles garotos impuros do ensino médio se contentariam com isso.
— ...Eu acho a Usami bonitinha.
Eu simplesmente disse o primeiro nome que veio a minha mente, mas eles pareciam um pouco desapontados e fizeram caras estranhas.
— Que sem graça. Não podia ser mais normal, podia? Você é tão chato — queixou-se Kamogawa.
— Então você alega que não é comum se sentir atraído pela Tsukimori?
— Admito que ela também seja um alvo comum, mas a sua qualidade, por assim dizer, está em um nível totalmente diferente da Usami! Se a Usami fosse suco de laranja, Tsukimori seria vinho.
— Então você não concorda que suco de laranja satisfaz a nós, inferiores?
— Não, seu idiota, você não entendeu. Eu estou falando sobre, hum, bem, aquela certa atração pelo álcool por que você na verdade não pode beber, sabe? Como se você estivesse curioso a respeito do misterioso mundo que se abre aqui e... você está me acompanhando?
— Eu obviamente entendo o que você quer dizer. Mas eu ainda prefiro suco de laranja. Você não?
— Hum, bom, claro, eu gosto de suco de laranja também, mas…
Os rapazes da aliança do Kamogawa resmungaram e contorceram seus rostos.
Embora Tsukimori fosse de fato uma garota excepcional, Usami também era muito atraente... para uma garota comum. A reação deles se originava do fato de não quererem admitir que eu estivesse certo mesmo não podendo negar isso.
Sentindo-me como um vencedor, eu disse:
— Vamos brindar com um pouco de suco de laranja e vinho então.
Você poderia dizer que eu provei o “esplêndido vinho da vitória.”
— Você é um belo de um maldito cara sorrateiro, sabia disso?
— Obrigado.
— Eu não estou o elogiando.
Kamogawa ainda estava um pouco mal-humorado, mas eu tinha conseguido tirar seu fôlego.
— …Ei, garotos! Voltem a seus lugares! As aulas da tarde estão começando!
Orientados por essa repentina voz, os rapazes viraram seus olhos na direção do relógio simultaneamente. Sua reação tão sensível se devia ao fato do aviso ter vindo da garota da qual tinham acabado de falar.
— Ela está certa. Vamos seguir o conselho da Suco de Laranja e esperar em nossos lugares — falou Kamogawa e, em seguida, todos retornaram às suas respectivas carteiras.
— Suco de Laranja? — perguntou-se Suco de Laranja, popularmente conhecida como Chizuru Usami, e inclinou sua cabeça redonda. — …Aposto que vocês estavam falando mal de mim ou o algo do tipo, não estavam?”
Usami, sentada ao meu lado, franziu os lábios.
— Nós estávamos simplesmente falando sobre bebidas.
— Mentira. Se um grupo de garotos se reúne, eles falam ou sobre coisas pervertidas ou sobre coisas idiotas — afirmou ela.
Eu tenho que dizer que aquele era um preconceito bastante injusto. Porém, infelizmente, eu não podia desmenti-la.
— …Que tipo de vida trágica você tem levado, Usami? Agora eu fiquei um pouco preocupado com você.
— Não tenha pena de mim, Nonomiya! Idiota. Eu sou normal! Sou uma garota comum de ensino médio!
Usami sempre reage imediatamente toda vez que a provoco. E sempre que reage, ela parece um pequeno animalzinho — é realmente divertido de ver.
— Escute, você deveria ir ao hospital antes que seja tarde demais. Se for muito embaraçoso ir sozinha, eu posso acompanhá-la, mas...
— ...Eu não vou! Para de olhar para mim com esses olhos de pena!
Ela afastou minha vigilante cabeça pra longe com sua mão:
— Vá embora!
— Alegre-se, Usami. Parece que Nonomiya é apaixonado por suco de laranja!
Kamogawa, que estava olhando para nós, riu com uma cara de quem fala apenas coisas pervertidas ou idiotas.
— Diga-me logo, o que é esse negócio de suco de laran...
Usami engoliu suas palavras no meio da frase. Nosso professor de matemática, Kumada, entrara na sala.
Os únicos sons na sala eram da voz fraca do Kumada e do giz batendo na lousa.
Aparentemente nossa conversa ainda incomodava Usami; ela continuou a me olhar furtivamente.
Após alguns minutos, ela finalmente perdeu a paciência. Inclinou a parte superior do seu corpo um pouco pra perto de mim e sussurrou:
— Sobre o que era aquilo?
— Eu estou tentando me concentrar na aula, Usami-san — respondi sem tirar meus olhos da lousa.
— …não seja mau.
Como eu continuei calado, ela começou a me cutucar com sua lapiseira. A ponta atravessou o tecido do meu uniforme e cravou-se na minha pele.
— Ei, isso dói.
— Então não me ignore — aborreceu-se Usami. — Durante a pausa para o almoço, vocês garotos estavam falando sobre a Youko-san, não estavam?
— Oh, estávamos?
— …você sempre tentar escapar desse jeito, Nonomiya. Na verdade, eu sei que vocês estavam falando sobre ela!
— Você estava nos espionando? Estou chocado.
— Não é nada disso! Eu apenas ouvi o nome da Youko-san casualmente! Porque vocês garotos falam muito alto!
— Usami — chamei sua atenção pois Kumada havia se virado de frente para a turma. Ela se sentou direito apressadamente e fingiu que copiava o que estava no quadro.
Depois de alguns momentos de silêncio:
— …Diga Nonomiya. Você prefere garotas como a Youko-san também, não é? — murmurou Usami enquanto olhava para baixo para suas anotações.
Eu olhei para frente, à direita. Youko Tsukimori, a garota em questão, fitava carismaticamente o quadro-negro. De lado, seu rosto parecia inteligente, dando-lhe um pouco daquela atmosfera de apresentadora de notícias.
Sentada bem no meio da sala, sua aura fora do comum fazia parecer que ela era o coração da classe.
De fato, ela tinha algo de especial. Embora eu evitasse contato com ela, conseguia entender muito bem o porquê de todos pareciam adorá-la.
— ...Não, não particularmente.
Eu não gosto de problemas, mas fiquei interessado em como Usami reagiria.
— É isso mesmo?
Ela sorriu, parecendo de certa forma aliviada.
— Nós discutimos essa alegoria: se ela fosse uma bebida, Tsukimori seria vinho.
...Que tipo de reação ela me mostrará, eu me pergunto.
— E, a propósito, você seria suco de laranja.
Atrás de mim escutei o som de uma ponta de lápis se quebrando.
— Ah é?
Usami brincou com a lapiseira entre os dedos, fingindo indiferença. Contudo, não esquecerei o momento em que suas bochechas coraram.
Depois disso, o interrogatório de Usami parou.
Sua reação honesta tinha algo que acalmava minha mente. Eu havia citado o nome dela somente para dissuadi-los, mas talvez eu tivesse na verdade revelado meus verdadeiros pensamentos, que eu tinha inconscientemente em mim.
Pelo menos naquele momento, senti que gostava da Usami.
— ...por falar nisso.
Eu considerava nossa conversa terminada, mas parecia que ela ainda queria dizer alguma coisa.
Usami sussurrou com uma séria expressão no seu rosto:
— E-Eu sou normal, sabia? Uma garota normal! Não uma garota estranha como você assumiu antes! Eu não quero ser mal compreendida, certo?
Eu acidentalmente sorri por causa das amáveis palavras de Usami.
Sua honestidade era muito confortável para mim, quase como o sabor de um delicioso copo de suco de laranja.
Desejei que eu pudesse me apaixonar por ela.
Depois da reunião mensal dos representantes de classe, vi a representante da minha turma sair apressada e voltei para nossa sala.
Tendo encontrado o lugar vazio, eu me preparei para ir embora também. Como não estava em nenhum clube, não tinha mais nada para fazer na escola. O que me restava era ir para casa e me preparar para meu trabalho de meio período.
Quando parei em pé diante da minha cadeira, reparei um caderno universitário no chão. Imediatamente percebi a quem ele pertencia. Na capa lia-se “Youko Tsukimori”.
Eu olhei ao redor da sala, mas ela não estava ali. Decidi deixar o caderno na mesa dela antes de ir.
Mas justamente quando ia fazer isso, registrei que um pedaço de papel escapava do caderno. Eu peguei o papel e, julgando que não era nada, puxei para fora.
— …agora, isso foi inesperado — falei sem querer.
O papel acabou por ser uma folha A4 dobrada. A mensagem nela escrita não combinava nem com a Tsukimori de quem todos falavam nem com a imagem pessoal que eu tinha dela.
Depois de me certificar que ninguém estava vendo, coloquei aquilo na minha mochila. Fiz isso pois presumi que levaria algum tempo para ler tudo que estava escrito.
Você pode dizer que eu sucumbi à tentação.
Não, naquele exato momento eu não senti nem mesmo um pingo de culpa. Era apenas pura curiosidade.
Eu não tinha nada contra vinho. Pra começo de conversa, eu não posso julgar sem nunca ter tomado uma gota. É só que meu apego a bebidas com as quais já estou familiarizado proporcionou minha cautela com uma desconhecida.
Em resumo, fiquei interessado no vinho que todo mundo elogiou tanto.
— Tudo bem, que tipo de segredo do nosso ídolo está prestes a vir à tona?
Sai da sala como sempre fiz.
Já passava das 10 da noite quando voltei para casa depois de terminar meu trabalho no café.
Quando cheguei lá, tinha esquecido completamente da folha. Eu estava ansioso para ler seu conteúdo, mas as várias tarefas no café relegaram sua existência para um canto da minha memória.
Eu gosto de observar as pessoas. Você pode até mesmo dizer que era um hobby meu.
Parte do motivo de eu ter escolhido trabalhar num café era certamente porque eu simplesmente gostava de café, mas, além disso, eu encontrava diferentes tipos de pessoas lá que poderiam ser consideradas muito interessantes.
Uma jovem mulher que sempre pega a mesma cadeira e fica só olhando para o lado de fora. Um homem na flor da idade que troca de namorada a cada visita. O frio relacionamento de um casal que era profundamente apaixonado há apenas meio ano. E muito mais.
Tem algo nisso que excita minha imaginação... meu passatempo favorito.
Entretanto, na realidade, eu não era diferente do Kamogawa e dos outros. Também era apenas um adolescente de 17 anos de idade. Não buscava saber a verdade. Eu simplesmente queria me divertir imerso em minhas fantasias.
Eu estava relaxando, tomando um banho morno, quando me lembrei da folha que havia pegado depois da aula.
Com o corpo ainda morno, mergulhei na minha cama e desdobrei o papel. Enquanto me segurava para não me apressar, lentamente olhei para o título.
“A Receita de Assassinato”
Senti-me como se estivesse lendo um romance de mistério de algum autor popular. Talvez isso fosse devido ao título realmente soar como o de um romance.
O pedaço de papel que apareceu do caderno da pessoa que estava na boca de todo mundo: Youko Tsukimori.
Rumores tratando de sua intensa vida amorosa pareciam não ter fim, mas sua imagem ainda parecia impecável. Não tinha jeito da palavra “assassinato” combinar com uma garota como ela.
Talvez fosse esse o fato que atiçara minha curiosidade. Contrastes como esse tem um tipo de mágica que te absorve, seja para o bem ou para o mal.
Meu olhar deslizava pelo texto, completamente absorto por ele. Leal ao seu título, “A Receita de Assassinato”, ele introduzia diferentes formas para matar alguém.
Eu notei que várias partes do texto haviam sido apagadas e corrigidas, indicando que a receita tinha sido revisada várias vezes. Eu quase podia sentir a respiração de quem escrevera esses caracteres tão desorganizados. Tinha algo vívido nisso, por assim dizer.
Enquanto lia, descobri uma coisa que todas as abordagens tinham em comum.
O objetivo mais importante parecia ser eliminar o alvo sem ter que sujar suas mãos. Não era um texto escrito por um humano que gostava de matar... que coloca o ato de matar como seu maior objetivo.
— …ela está aspirando se tornar uma autora de mistério.
Aqueles pareciam exatamente com truques de uma história de mistério. Contudo, eles foram escritos de maneira bastante desajeitada e estavam longe da perfeição.
Exemplificando: essa é uma forma de matar intitulada “A Receita de Assassinato do Acidente de Trânsito Fingido”. O conteúdo era muito simples.
Em uma estrada íngreme ao longo de uma montanha.
Atrapalhe o motorista de alguma forma.
Faça-o perder o controle do volante.
Estava escrito em tópicos assim. Comentários adicionais como “Telefonar para o motorista para fazer com que ele perca a concentração?” ou “Pôr algum obstáculo na pista?” estavam adicionados de forma esparsa.
Como se pode ver, o grau de acabamento ainda estava muito baixo. Talvez ela ainda estivesse no estágio de juntar várias ideias e tentar aperfeiçoá-las?
O risco havia sido reduzido ao mínimo, porém, acho que aqueles planos provavelmente não teriam sucesso. Eu podia vê-la tentar, mas esses eram planos fracos, caso ela fosse realmente matar alguém.
Eu larguei a receita de assassinato na minha mesa.
Devido às minhas grandes expectativas, o desapontamento foi grande. Todo aquele conteúdo excessivamente infantil da receita acabara com meu interesse.
— Isso só estragou minha felicidade pós-banho.
Depois de reclamar em voz alta, estendi meu braço para minha prateleira para remover aquela sensação ruim lendo um mistério de verdade.
— …não, espere um segundo.
Contudo, parei minha mão e comecei a pensar. Um novo pensamento mais uma vez elevou meu espírito a um novo patamar.
Quem era a dona dessa “Receita de Assassinato”?
Era Youko Tsukimori!
E se, apenas hipoteticamente, ela tivesse escrito isso porque queria seriamente matar alguém...? Esse raciocínio fez o texto rude parecer um pouco mais realista agora.
Deixando a razão de lado por hora, tinha alguém que Tsukimori queria que morresse e ela desesperadamente escreveu um plano de assassinato para fazer isso acontecer.
A Tsukimori escreveu! Aquela perfeita, elegante, bela, inteligente “Tsukimori” que todo mundo adorava!
E ela tinha elaborado tal plano imaturo de assassinato de novo e de novo.
— …mas não é uma graça?
Se meu palpite se tornasse realidade, eu quase me tornaria um grande fã seu.
Minha imaginação foi posta em movimento. Comecei a questionar todo o tipo de coisa, como a pessoa que ela desejava matar, seu provável motivo e sua personalidade oculta. Continuei a jogar esse jogo até o céu começar a clarear no leste.
Na manhã seguinte, cheguei à escola tarde como normalmente faço.
No momento em que entrei na sala, a maioria dos meus colegas já estava presente. É claro, Tsukimori também estava entre eles.
Enquanto caminhava para minha carteira, secretamente dei uma espiada nela. Ela estava colocando as coisas da sua mesa em ordem. Ao menos para os outros, isso parecia uma ação perfeitamente normal.
Não para mim.
— Bom dia, Tsukimori — cumprimentei-a como sempre.
Ela parou de olhar para sua mesa, inclinou sua cabeça e olhou para mim enquanto usava seu dedo mínimo para sacudir seu longo e gracioso cabelo para fora do rosto.
— Bom dia, Nonomiya-kun.
Ela me mostrou o sorriso maduro de sempre.
Normalmente, nossa conversa terminaria aí. Conhecíamos um ao outro o suficiente apenas para trocarmos cumprimentos.
— Você está procurando alguma coisa?
Contudo, naquela manhã, eu não estava disposto a deixar terminar desse jeito. Minha curiosidade me irritava por eu suspeitar que ela talvez estivesse procurando pela “A Receita de Assassinato”.
Eu a encarei intensivamente, não querendo perder o menor movimento.
— Não, estou apenas arrumando minha mesa.
Lamentavelmente, o sorriso dela permanecia inalterado.
Eu falei para ela:
— Compreendo.
E me virei em direção da minha própria carteira, enquanto pensava comigo mesmo se a realidade era assim tão entediante comparada à imaginação.
— Mas… —, ela repentinamente me chamou, de trás —, por que você pensou que eu estivesse procurando alguma coisa?”
Eu estava desesperado para não dar um largo sorriso.
Era como se a presa tivesse pulado direto na minha armadilha, era essa a sensação. Quaisquer que fossem seus sentimentos, comecei a ficar de alto-astral apenas pela expectativa de alguns desenvolvimentos divertidos.
— Não, receio que não há nenhuma razão em particular. — Me virei de volta na direção dela, fazendo-me de desentendido. — Mas deixe-me retornar a questão: por que a pergunta?
Decidi sondar de leve.
— Eu não tenho nenhuma razão em particular também.
— Entendo.
À minha frente havia apenas seu maduro sorriso inalterado. Senti vontade de fazer aquele sorriso congelar, mas ainda não queria chegar ao centro disso. Eu acho que é melhor guardar meu trunfo para o final.
— Mas se… —, comecei —, se estiver com problemas, sinta-se livre para me pedir ajuda.
— Algum problema, Nonomiya-kun? Não me lembro de você ser tão gentil.
— Eu sou mais gentil do que você imagina, tenha certeza disso.
— Peço que me perdoe. Com certeza me lembrarei disso agora.
— É claro que o principal motivo seria para fazer uma garota de proeminente popularidade como você ficar em dívida comigo, de qualquer forma.
Tsukimori riu.
— Obrigada. Vou consultá-lo diretamente na mesma hora, Nonomiya-kun, sempre que eu estiver com problemas.
Tsukimori sorriu com seus olhos de amêndoas meio fechados.
Não parecia que ela não estava planejando alguma coisa. Não nego a influência do meu desejo nessa avaliação.
Nossa conversa acabou porque nosso professor, Ukai, havia aparecido na sala.
Meu humor estava um pouco bom hoje. Kamogawa e seus camaradas estavam aborrecidos quando vieram me questionar sobre minha conversa com a Tsukimori no intervalo, mas eu considerei que ela tinha rendido bons resultados, pois descobri o quão emocionante e divertido era conversar com ela.
Bom, embora isso fosse apenas eu saboreando a emoção produzida pelas minhas próprias fantasias.
Mas ainda era muito melhor do que a entediante realidade.
Sem qualquer progresso ou informação nova, minha pacífica rotina continuou e, antes que eu me desse conta, duas semanas haviam se passado desde que eu encontrara a receita de assassinato.
Como não havia nada para agitar minha imaginação, meu excitamento se acalmou e eu estava me esquecendo da existência da receita.
Como eu tinha segurado minha carta na manga, o jogo havia parado de forma lenta e silenciosa. Era verdadeiramente uma situação patética.
No entanto, uma mudança ocorreu de repente.
Talvez… o jogo nem mesmo tivesse começado.
Eu fui pra escola como sempre, e a classe estava costumeiramente barulhenta. Mas a Tsukimori não estava nenhum lugar que eu pudesse ver. Seu lugar estava vazio.
Eu estava intrigado, mas a resposta não demoraria a vir.
— Ei, Nonomiya! Você ficou sabendo?
Era Kamogawa.
— Não posso disser que sim.
É claro que eu não fazia ideia do que ele estava falando, pois sua sentença não tinha assunto.
— Alguém da família da Tsukimori morreu.
Eu senti minha frequência cardíaca acelerar.
— Quem? — perguntei enquanto suprimia a crescente excitação.
— O pai dela, pelo que parece. Foi um acidente de trânsito. Youko-san tem todas as minhas condolências… — respondeu Usami, com uma cara triste.
— Realmente, sinto muito por ela. Perder o pai nessa idade, é tão…
Ao contrário de seu comportamento comum, até mesmo Kamogawa mostrava uma expressão fúnebre. Essa devia ser a reação normal.
— …De fato. Vamos todos apoiá-la.
Entretanto, eu abrigava emoções diferentes das dos outros. Youko Tsukimori, acidente de trânsito, morte... essas palavras-chaves me levaram direto para a receita de assassinato.
Desesperadamente suprimi o sorriso que cintilou no meu rosto.
Isso está ficando interessante.
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