Capítulo 1 [Download]
No canto superior direito do quadro-negro virtual, um alerta de mensagem amarelo piscava.
Haruyuki, que estava sonhando acordado durante a aula, involuntariamente balançou a cabeça e mudou o foco de seus olhos.
Naquele momento, o quadro ficou transparente, mas o professor e os alunos mantiveram-se nítidos.
A classe, os alunos e o professor existiam no mundo real, mas o quadro e a complicada fórmula matemática nem tanto. Os números e a fórmula que o professor estava escrevendo no ar eram enviados ao «Neuro Linker» em seu pescoço e diretamente ao seu cérebro em forma de uma imagem.
O professor, com dificuldade, moveu seu dedo pelo quadro e continuou a explicar a fórmula em um tom de voz suave, cujo volume não era suficiente para chegar aos ouvidos de Haruyuki no mundo real: O Neuro Linker do Professor aumentava-a em volume e clareza, e então a enviava a Haruyuki.
Quando ele olhou para o quadro, agora com mais fórmulas que antes, este voltou a ficar sólido. Então parecia que o e-mail que ele havia recebido não era o Professor mandando um arquivo comprimido para a tarefa de casa. Significava que, como ele estava separado da Rede Global, o remetente era um aluno da mesma escola.
Alguma garota que quebrou as regras e o enviou uma mensagem legal: Esse tipo de expectativa ele havia descartado há muito tempo. Pensou em simplesmente arrastar a mensagem para o lixo no canto da tela, mas, se fizesse isso, ele não sabia o que aconteceria depois.
Assim que o professor deu as costas, ele moveu sua mão direita e clicou no símbolo de mensagem.
Instantaneamente, Bubibaborobubiro! Um som diferente e uma imagem de uma inundação apareceram na frente de Huruyuki.
“Porco-kun, essa é sua diretriz para hoje! (Risadas no fundo) Duas rosquinhas fritas, um pão com creme de melão e três iogurtes de morango. Traga-os para o telhado no começo do intervalo. Atrasar-se significa Punição do Pão de Carne! Fofocar significa Punição do Filé de Porco Assado! (Mais Risadas).”
Ele olhou para a esquerda, só para ver Araya e seus subordinados A e B zombando dele.
Gravar esse tipo de e-mail com sons e imagens durante a aula era impossível, eles tinham planejado. Que bando de pessoas “agradáveis”, e com a história de “Diretriz”, o elogio era enviado em dobro. Idiotas!
Haruyuki começou a abusar deles em sua mente: falar em voz alta e colocar em um e-mail era uma coisa que obviamente ele não deveria fazer. Se Araya era um tipo de inseto que não era extinto não importa quanto tempo passasse, então Haruyuki, que era (intimidado) ¹ por ele seria apenas um tolo que estava preso à (roda) ¹.
Na verdade, se ele tivesse o mínimo de coragem e vontade de agir, poderia usar aquele e-mail e outras dezenas de «evidências» que ele mantinha e entregá-las à escola. Araya e seus “amiguinhos” seriam facilmente punidos.
Entretanto, Haruyuki não parava de pensar no que poderia acontecer depois.
Mesmo que digam que o Neuro Linker é tão comum como uma pesoa em um país, e que a metade da vida de alguém fosse vivida inteiramente no mundo virtual, Humanos ainda posuíam um corpo físico como estorvo, e continuavam a existir em uma condição de baixo nível. Nós temos fome durante a hora das refeições e vamos ao banheiro, se formos atingidos, sentimos dor, etc.
A Habilidade com o Linker determina o avanço e pormoções na escola: esse tipo de conversa é somente a estratégia de imagem de uma empresa gigantesca. O que determina o valor de uma pessoa é, no entanto, a aparência e a força física, esses tipos de parâmetros primitivos.
Isto era de quando o estudante do 5º ano do ensino fundamental, com um peso de mais de 60kg, durante corridas de 50 metros nunca conseguiu concluir em menos de 10 segundos, e, eventualmente, se tornou a conclusão do estudante de 13 anos Haruyuki.
Toda manhã antes da escola, sua mãe carregava seu Neuro Linker com 500 yens para o lanche, porém comprar pães e sucos para o grupo de Araya usava tudo o que ele tinha. Ele possuía 7000 yens guardados, mas se ele gastasse aquilo ele não seria capaz de comprar o jogo somente para linker que sairia esse mês.
O grande corpo de Haruyuki tinha um problema com falta de comida: se pulasse uma refeição sequer, seu estômago o faria desmaiar, mas hoje ele teria que aguentar. Além disso, durante o intervalo, quando ele consegue usar o «Full Dive», há alguns meios especiais (?) para ele.
Encolhendo-se o máximo que podia, Haruyuki foi em direção ao segundo prédio da escola que estava alinhado com salas de aula especiais. Atualmente, de experimentos de física a lições de cozinha, aulas eram ministradas virtualmente, fazendo aquelas salas serem inúteis, então poucas pessoas iam ali. Especialmente na hora do intervalo, não se via ninguém nos arredores.
Ao lado da entrada empoeirada se encontrava o banheiro masculino, o Santuário Escondido de Haruyuki. Rapidamente entrou, parou para tomar fôlego, e então olhou para o espelho sobre a pia.
O que foi refletido no espelho, como se fosse visto em um drama de TV, foi uma pequena e gorducha criança.
Seu cabelo rebelde balançava aqui e ali, as curvas de suas bochechas não possuiam nenhum angulo agudo. Em volta de seu pescoço, a gravata do uniforme escolar e o Neuro Linker eram praticamente “engolidos”, dando a impresão de que ele estava sendo enforcado.
Ele tinha que fazer algo sobre aquela aparência. Ele uma vez chegou a deixar de comer. Porém, o resultado foi um colapso por anemia durante o intervalo, e o pior pesadelo do lanche de várias alunas foi criado.
Depois disso, Haruyuki jogou fora aquele “ele”- pelo menos enquanto fosse um estudante.
Ele parou de olhar o espelho após um décimo de segundo, e então entrou em um cubículo. Certificou-se de que o havia trancado, então baixou a tampa do vaso sanitário e sentou sobre ela. Já estava acostumado ao plástico cortando as partes inferiores de seu corpo. Ele se encostou na caixa d’água, relaxou, e fechou os olhos.
Suas palavras eram como um feitiço para libertar sua alma de seu corpo amaldiçoado.
“Direct Link.”
Quando o Neuro Linker recebeu o comando de voz, sua conexão quântica evoluiu do Modo de visão e audição para o Modo Integral.
A sensação do peso do corpo de Haruyuki e de seu estômago roncando desapareceram.
O assento duro do vaso sanitário e o uniforme apertado também desapareceram. O som alegre de alunos no pátio distante, o cheiro de produtos de limpeza, e até a porta que estava diretamente à sua frente, dissolveram na escuridão.
«Full Dive».
Até o senso de gravidade desapareceu. Haruyuki caiu na profunda escuridão.
Entretanto, logo uma leve sensação de flutuação e a luz de um arco-íris cobriram seu corpo inteiro. Dos pés a cabeça, o Avatar usado em Full Dive estava sendo formado.
No lugar de mãos e pés, haviam cascos. Membros roliços, o corpo esférico com uma cor rosa-claro. Ele não podia se ver, mas deveria haver um nariz achatado bem no meio de seu rosto, e grandes orelhas penduradas dos lados. Era, em outras palavras, o formato de um porco.
O avatar cômico caiu no meio de uma floresta.
Cogumelos enormes cresciam por todos os lados. O sol brilhava fortemente, e, no centro, uma fonte cristalina jorrava.
Na borda, como uma grande árvore oca, várias rodas estavam empilhadas. Eram utilizadas para conversar e relaxar, com vários andares conectados por escadas.
Aquele espaço virtual era a rede local do Colégio Secundário Umesato, onde Haruyuki estudava.
Aqueles caminhando em pares ou trios pela floresta eram, em sua maioria, não humanos. Cerca de metade eram animais engraçados caminhando sobre duas pernas, e o resto eram fadas, robos e magos. Todos eram avatares de estudantes do Colégio ou professores na rede local.
O avatar dos estudantes poderia ser pego de vários lugares, e podia ser customizado. Se possuísse a perseverança necessária, você poderia até usar o editor e criar um avatar totalmente original. Apesar de ser o senso e a habilidade de um estudante do ensino fundamental/médio¹, o Cavaleiro Negro original que havia sido lançado em abril tinha atraído muita atenção.
Foi só um breve momento de fama. Haruyuki suspirou e olhou o seu formato atual. Num piscar de olhos, Araya havia se envolvido com o Cavaleiro Negro, e ele havia sido forçado a utilizar aquele porco padrão.
Naturalmente, aquele avatar não havia deixado de ser único, pois ninguém iria utilizar um avatar tão auto-degradante. Similar a quando estava no mundo real, Haruyuki se encolheu ao máximo enquanto corria em direção a uma árvore.
Ao olhar para os bancos em volta da fonte, viu uma grande quantidade de pessoas. Enquanto corria, ele os fitava, e então começou a caminhar. No meio do grupo de estudantes, estava um avatar único raramente visto.
Não era algo que estava no conjunto padrão. Um vestido negro ornado com pedras transparentes. Mãos delicadas segurando uma sombrinha de cor preta. Nas suas costas, asas de borboleta, também negras, com linhas coloridas como o arco-íris correndo por elas.
Uma face pálida como a neve com um longo cabelo liso. A beleza era tamanha que era até difícil de acreditar que era um avatar customizado. Nem mesmo Haruyuki poderia competir com esse nível profissional de design.
Apoiando levemente seu corpo delicado em um enorme cogumelo e ouvindo a conversa das pessoas em volta com uma expressão indecifrável, Haruyuki conhecia ela como a estudante do segundo ano que também era presidente do conselho estudantil. Surpreendentemente, aquela beleza era quase uma cópia idêntica de seu “eu verdadeiro”, por isso as pessoas a chamavam de -,
«Princesa da Neve Negra» «Kuroyukihime»
A única coisa em comum entre eles era o fato de ambos estudarem no Colégio Umesato, o que por si só já fazia Haruyuki sentir que era uma mentira. Forçadamente, ele continuou a andar.
Seu destino era uma árvore com várias salas de descontração. Simplesmente chamada como “Canto dos Jogos”, (Claro, sem nenhum software de mercado, como RPGs ou Games de Luta) estava cheia de jogos educacionais, como esportes, quiz e quebra-cabeças. Mas mesmo assim vários estudantes enchiam as salas, soltando gritos de incentivo.
Todos eles estavam em Full Dive da sala de aula ou da cafeteria da escola. Enquanto isso, seus corpos reais estavam totalmente sem defesa. Fazer brincadeiras com alguem que estava dessa maneira era obviamente falta de educação, mas a única pessoa que se importava era Haruyuki. Uma vez ele havia entrado em Dive na sala de aula. Quando ele retornou, suas calças haviam sumido. Isso havia acontecido menos de um mês depois de ele ter entrado na escola.
Escondendo seu corpo real no banheiro e fugindo das pessoas no mundo virtual, ele subiu as escadas esculpidas no tronco da árvore. Conforme ele ia subindo, menas pessoas haviam nas salas.
Ele passou pelas salas de Beisebol, basquete, golfe, tênis e futebol, chegando à sala de «Virtual Squash».
Não havia ninguém. A razão para o jogo não ser tão popular era claro. Squash é similar ao Tênis, mas você devia rebater a bola para uma parede, sendo a partida jogada em um cubículo. É um esporte muito solitário.
O gênero de que Haruyuki mais gostava era FPS, onde ele segurava uma arma e corria em volta no campo de batalha. Lá ele possuía habilidades que estavam acima até dos americanos. Claro que o gênero era popular no Japão também, mas de maneira nenhuma a rede escolar disponibilizaria esse tipo de jogo.
Ele se encaminhou ao lado direito da quadra e tocou o painel de controle com uma mão. Digitou sua ID de Estudante, e então sua pontuação foi lida.
Durante o primeiro semestre da escola, Haruyuki passava a maior parte do intervalo ali para matar o tempo. Resultou em uma pontuação cujo número chocava. Ele estava começando a ficar enjoado do jogo, mas não havia outro lugar para ele ir. Sua mão direita rosa segurou firmemente na raquete que flutuou do painel.
Depois do aviso “Início do Jogo”, uma bola saiu de um lugar que ele não conseguiu identificar. Ele a atingiu com a raquete com toda sua força.
Deixando somente um clarão, a bola voou feito um laser, bateu no chão e na parede e então retornou. A reação de Haruyuki foi mais rápida que a sua visão, seguindo a solução calculada automaticamente pelo seu cérebro, ele se moveu para trás enquanto rebatia a bola.
O Haruyuki real obviamente não poderia fazer aquele movimento. Mas aquele era o mundo virtual que tirava as limitações de seu corpo físico. Reconhecer a bola e mover seu corpo eram apenas comunicações de sinais quânticos entre o cérebro e o Neuro Linker.
A bola lentamente perdeu sua substância e se tronou uma trajetória brilhante. “Pon Pon” era o efeito de som mais repetido, várias vezes por segundo, assim como uma metralhadora atirando. Mesmo assim, o corpo suíno de Haruyuki pulava livremente, com a raquete rebatendo em todas as direções.
Eu não preciso de realidade.
Sua mente não deveria vagar quando jogava no limite de velocidade, mas ela ainda gritava, cheia de ressentimento.
Por que algo como escola e salas de aula ainda eram necessários? Humanos podem viver no mundo virtual, e os adultos que já faziam isso eram muitos. No passado, experimentos foram feitos onde a consciência humana foi totalmente convertida em dados eletrônicos, e eles construíram um mundo real diferente.
Mesmo assim, para aprender como viver em sociedade, expressar suas emoções e outras razões idiotas, crianças eram jogadas na cadeia da realidade juntas. Para pessoas como Araya era provavelmente uma boa ideia, eles poderiam soltar o estresse moderadamente, e manter seu dinheiro. Mas, para mim – não, mais que isso, o que eu posso fazer?
“PIPON”. O nível do jogo subiu.
A bola subitamente acelerou. O ângulo de reflexão dela ficou irregular, e veio por um caminho que ele não havia previsto.
O tempo de reação de Haruyuki começou a ficar atrasado.
Mais rápido. MAIS RÁPIDO.
O mundo virtual, o mundo real também, quebre todas as barreiras, vá a um lugar com ninguém para –
Acelere!
A raquete dele cortou o ar. A bola que havia se tornado luz raspou na bochecha de Haruyuki, passou por ele e desapareceu. Com um som cômico, as palavras “Fim de Jogo” caíram do telhado, e quicaram no chão da quadra.
Sem olhar para a pontuação mostrada, o entristecido Haruyuki foi em direção ao painel para reiniciar o jogo.
Naquele momento, uma voz ecoou no santuário sagrado de Haruyuki.
“Ah -! Então você está se escondendo nesse lugar!”
Uma voz aguda entorpeceu seus ouvidos – não, seu cérebro, com um grito. Assustado, Haruyuki se virou para ver quem/o que havia feito aquilo. Ele viu um avatar de tipo similar ao seu.
Mesmo assim, não tinha um pingo do humor que o porco dele tinha. Flexível e esbelto, um gato com pelagem roxa/prateada. Uma orelha e a ponta da cauda tinham um laço azul cada. Não havia sido feito do zero, mas vários de seus parâmetros eram customizados.
Cores agressivas flutuavam em seus olhos dourados. A boca do gato cheia de pequenos dentes afiados se abriu e gritou novamente.
“Haru não tem aparecido na hora do lanche ultimamente então eu comecei a procurar. Ficar jogando até que é bom, mas você não precisa jogar esse aqui, vá jogar com todo mundo lá embaixo!”
“…É a minha escolha, me deixe em paz.”
Era a única coisa que ele conseguiu pensar em resposta. Então ele se virou, e andou em direção à quadra novamente. Mas a gata prateada extendeu o pescoço, olhou a mensagem de Fim de Jogo, e gritou com a voz aguda. De novo.
“O que… é isso…? Nível 152, Pontuação 2,630,000!? Você…”
- É incrível!
Mesmo envergonhado, Haruyuki momentâneamente esperou esse tipo de comentário, mas a gata o traiu logo em seguida.
“Você é um idiota? O que você está fazendo sem comer o lanche? Desconecte-se já!”
“…De jeito nenhum, ainda tenho 30 minutos de intervalo. Você deveria ir para outro lugar.”
“Bem, se essa é a sua resposta, então terei de usar a força.”
“Pode vir com tudo.”
Depois de murmurar a resposta, Haruyuki agarrou sua raquete novamente. O avatar da rede escolar não possuía «Determinação de Impacto». No contexto de prevenir condutas inapropriadas, um estudante não pode tocar o avatar de outro estudante. Logo, forçar alguém a deslogar é impossível.
O avatar gato, depois de extender sua lingua ao máximo, gritou.
“Link Out”
Instantaneamente, deixando para trás um vortex de luz e um som similar a sinos, o gato desapareceu.
A barulhenta finalmente havia desaparecido. Ele suspirou levemente enquanto se sentia um pouco sozinho.
Bang! Algo atingiu sua cabeça e a vista ao redor desapareceu. Da escuridão, puxado por pontos de luz, ele voltou ao cenário do mundo virtual.
Enquanto sentia seu peso, Haruyuki piscava desesperadamente, tentando focar sua visão.
Originalmente um cubículo do sanitário masculino. Porém, ao invés da porta cinzenta, Haruyuki viu algo que não estava esperando.
“Você… Por que…!?”
De pé na frente dele, estava uma estudante feminina. A cor de seu casaco e laço mostrava que era uma estudante do primeiro ano também.
Ela era pequena, menos de um terço do peso dele. A sua franja curta estava penteada para o lado direito com um grampo azul. Fitava Haruyuki com olhos ardendo de raiva.
Sua mão esquerda segurava uma pequena cesta, e sua mão direita estava fechada bem acima da cabeça de Haruyuki. Vendo isso, ele finalmente entendeu porque havia sido desconectado. A estudante bateu em sua cabeça, e a segurança do Neuro Linker automaticamente fez um Link Out.
Normalmente, a segurança seria ativada ao secudir o ombro ou depois de um grito alto. Com garotas sensitivas, se chegarem a menos de um metro delas, o Neuro Linker as deslogava. A razão para Haruyuki não ter notado o intruso até ser atingido na cabeça foi pelo fato de estar escondido em um toalete, e sua segurança no nível mínimo.
“Por que você…?”
Surpreso, Haruyuki gritou com a única garota na escola com a qual ele podia falar sem entrar em pânico.
“O que você está fazendo? Esse é o banheiro masculino! A porta estava trancada… você é uma idiota!”
“Você é o idiota.”
A amiga de infância de Haruyuki escalou a parede do cubículo ao lado enquanto usava uma saia. Essa pessoa era Kurashima Chiyuri. Depois de responder em uma voz melosa, ela destrancou a porta atrás de si.
Com um movemento gracioso, ela pulou da parede do cubículo. Haruyuki fechou um pouco os olhos por causa da luz do sol refletida no cabelo castanho de Chiyuri. Ela posuía um leve sorriso em sua face.
“Ei, você já pode sair.”
“…Eu sei.”
Engolindo o suspiro, Haruyuki se levantou enquanto o assento rangeu. Enquanto seguia Chiyuri até a saída, ele perguntou.
“…Como você sabia que eu estava aqui?”
A resposta não foi imediata. Após inclinar sua cabeça para fora de banheiro e checar se o corredor estava vazio, Chiyuri se moveu para a frente e disse.
“Eu estava no telhado também. Então eu segui você.”
Isso significa –
“…Você viu.”
Haruyuki parou após colocar um pé no corredor, e sussurrou.
Fazendo parecer que estava tentando encontra as palavras certas, Chiyuri se encostou na parede oposta, e por fim assentiu.
“…Eu não vou falar nada sobre aqueles caras. Como Haru disse que estava tudo bem… Eu não tenho escolha. Mas você deveria comer seu lanche. Faz mal para seu corpo não comer nada.”
Com um sorriso forçado, Chiyuri ofereceu a cesta que trazia consigo na mão esquerda.
“Eu fiz algo. Mas não posso garantir que terá um gosto bom.”
- Tão miserável, pensou Haruyuki.
Seu coração tentando achar sentimentos além de compaixão por trás das palavras e ações de Chiyuri, era sem dúvida lamentável.
Porque Chiyuri tinha um namorado, que era de várias formas o oposto de Haruyuki.
A boca dele se moveu sozinha, uma estranha voz tênue saiu.
“…Restos do que você fez para Taku?”
A expressão de Chiyuri de repente ficou estranha. Incapaz de olhar para ela com as sobrancelhas erguidas, Haruyuki ficou olhando para o chão.
“Isso não é verdade, Ta-Kun traz lanche para a escola. Esse… sanduíche é feito com salada de batatas, presunto e queijo. O seu favorito.”
Haruyuki extendeu sua mão direita para empurrar a cesta novamente para Chiyuri.
Entretanto, o lento corpo real se moveu de um jeito diferente ao que havia sido ordenado. O movimento súbito fez com que a cesta saísse das mãos de Chiyuri e caísse no chão. Ao cair a tampa se abriu, revelando um ou dois sanduíches cortados em triângulos.
“Ah…”
Ele queria se desculpar pelo reflexo, mas sua cabeça ficou quente e as palavras que ele deveria falar não conseguiam tomar forma. Ele não podia levantar a cabeça, então ele deu um passo para tras, então gritou e deu as costas para Chiyuri.
“Eu não quero eles!”
Ele queria deslogar daquele lugar naquele instante, mas era claramente impossível. Ele deveria ao menos correr, mas seu corpo se tornou inacreditavelmente pesado. Ele não conseguia escapar da voz atras dele.
No pior humor possível, ele sobreviveu às lições da tarde e correu para casa.
Haruyuki deixou de lado a voz em sua cabeça que dizia que ele deveria esperar por Chiyuri na saída ou no caminho para casa para se desculpar, e foi para seu outro lugar secreto, a biblioteca.
Naturalmente, a utilidade de lugares como a biblioteca já não existia. Entretanto, alguns adultos pensavam que em uma escola, crianças necessitavam dos mesmos livros impressos em papel para aprender. Então, em um desperdício de material enorme, livros novinhos em folha ocupavam as prateleiras empoeiradas.
Basicamente por causa disso, Haruyuki possuía um importante espaço “privado” na escola, então ele não deveria reclamar. Ele pegou dois ou três livros grossos para servir de camuflagem e se sentou em uma cabine de leitura próximo à parede, sussurrando Full Dive em um volume quase inaudível para o linker.
Como faziam poucos minutos desde que as aulas haviam acabado, a rede escolar ainda estava bem quieta. Ele correu para se esconder no lugar de sempre, passando como um jato pela grama e subindo a árvore.
A quadra virtual de Squash estava vazia – como sempre. Honestamente, ele não queria simplesmente atingir uma bola, ele queria ir a uma batalha sangrenta onde poderia soprar aquela sensação confusa de dentro de seu peito o mais cedo o possível, mas sem uma conexão à rede global e dentro da escola, onde jogos eram proibidos de iniciar, era impossível.
Seu estômago vazio também estava passando dos limites, mas ele não queria ir diretamente para casa. Se ele encontrasse Chiyuri no caminho para casa, ele não tinha ideia de que expressão mostrar ou de que palavras usar. Não, se descupar era o suficiente, mas ele não sabia se sua boca iria seguir suas intenções.
- É a igual a aquele tempo.
No passado, Haruyuki havia feito Chiyuri chorar, mas ele deixou esses pensamentos de lado e moveu sua mão direita para logar no painel.
Ele alcançou a raquete, então sevirou para a quadra.
Ao abrir os olhos, ele estava pronto para bater na bola e descarregar todos aqueles sentimentos -.
Seu corpo congelou.
“Nível… 166!?”
Seu nível tinha aumentado algumas horas antes, mas naquele momento mais de 10 níveis haviam sido adicionados.
Como? A pontuação era arquivada na ID do Estudante! Após alguns momentos de reflexão, ele chegou à conclusão de que o jogo foi deixado aberto graças ao Log Out forçado que ele havia feito. Porém.
Quem além dele mesmo poderia fazer aquela pontuação absurda?
O orgulho de Haruyuki estava desabando, pois ele se sustentava em sua técnica de jogos de Realidade Virtual sob Full Dive. É claro, excluindo jogos de tabuleiro, onde sua inteligência determinava o resultado. Mas em jogos de tiro e de corrida, onde o tempo de reação era crucial, ele possuía a ideia de que ninguém naquela escola conseguia derrotá-lo.
Ele não se exibia para os outros. A razão disso eram várias experiências ruins durante o Ensino Fundamental. Não havia provas, mas ao que ele sabia até aquele ponto, quem havia feito aquela pontuação...
“Você fez aquela pontuação absurda?”
Atrás dele, havia uma voz feminina, mas não era a de Chiyuri. Um tom bem mais baixo, suave como seda.
Haruyuki se virou temeroso.
De pé na frente dele. Com a sobrinha apoianda no chão. Um vestido negro cravejado com pedras. Uma pele branca como a neve e olhos negros como a noite - «Kuroyukihime».
Mesmo sendo um avatar, ela não possuía um senso digital vindo dela. A pessoa mais popular da escola se movia na direção dele, sem sequer fazer barulho.
Um breve sorriso apareceu nos lábios vermelhos dela, o único lugar em seu corpo com alguma cor.
“Você quer… «Acelerar» mais, garoto?”
“Se você estiver interessado, venha ao saguão da escola na hora do almoço amanhã.”
Deixando essa frase para trás, Kuroyukihime abruptamente deslogou.
O avatar dela ficou na visão de Haruyuki por menos de 10 segundos. Era um bug de rede? Se não era uma ilusão, então ela havia pedido algo que ele não sonhava nem em um milhão de anos. Mas aquela pontuação na quadra era real.
Haruyuki não se sentiu em condições de tentar bater aquela nova pontuação, então deslogou e continuou sentado na cabine de leitura enquanto pensava. Em sua mente, aquelas três linhas de texto continuavam a aparecer em um loop infinito. A expressão de Kuroyukihime era diferente da habitual de uma estudante do Ensino Médio, mas a presença dela junto com a sensação desconfortável era algo que ninguém mais possuía, parcialmente devido ao fato de que ela não era popular só com os homens, mas com as mulheres também.
Haruyuki eventualmente deixou a escola com suas pernas bambas e foi para casa, seu corpo praticamente em modo automático. Se não fosse o Neuro Linker fazendo a predição do tráfego, ele teria sido atropelado 2 ou 3 vezes.
Chegando em casa, Haruyuki esquentou uma pizza e comeu com refrigerante. Seus pais haviam se divorciado há muito tempo, ele agora morava com sua mãe. Ela não voltaria até a meia-noite, e ele só a via brevemente de manhã, quando ela lhe entregava o dinheiro para o almoço antes de ir para a escola.
Com seu estômago cheio, Haruyuki voltou para seu quarto. Normalmente, ele checaria seus e-mails na Global Net, então entraria em alguns campos de batalha pela Europa por agumas horas, e guardaria sua energia restante para o dever de casa, mas hoje ele simplesmente não queria fazer nada.
Muitas coisas haviam acontecido hoje, sentia como se seu cérebro estivesse retalhado. Ele trocou de roupa, removeu o Neuro Linker e caiu na cama.
Ele queria dizer que seu sono foi tranquilo, mas pesadelos com Araya e sua gangue, Chiyuri chorando e o misterioso “discurso” de Kuroyukihime o faziam se revirar.
“Você quer… «Acelerar» mais?
Dentro de seu sonho, ao invés do avatar, quem dizia isso era o corpo da vice-presidente. Ele não a havia visto a não ser nas reuniões do conselho, onde ela mantinha uma expressão indecifrável. Mas por que no seu sonho ela tinha um sorriso maldoso como se o estivesse convidando a algum lugar, e sussurrava na orelha dele, ‘Venha aqui.’?
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